Minas Gerais

Quase 200 crianças e adolescentes esperam por transplantes de órgãos em Minas

Doação representa esperança e perspectiva de futuro para famílias

egundo dados do Sistema Nacional de Transplantes (SNT), do início de janeiro até 21/9, 59 crianças e adolescentes de até 17 anos receberam transplantes em Minas. Considerando a lista de espera para essa faixa etária no estado, o número representa menos de um terço das cirurgias essenciais para salvar a vida dos 181 jovens que ainda aguardam por um órgão ou tecido.

Maria Alice / Crédito: Arquivo  pessoal

As doações continuam abaixo do necessário para assegurar que meninas e meninos possam continuar vivos. De 2019 a 2022, foram realizados 282 transplantes nesse grupo de idades – uma média de 70 cirurgias por ano.

Nenhuma mãe pensa em perder seu filho na infância ou juventude. Decidir doar os órgãos de uma criança ou de um adolescente é poupar outras mães da experiência da dor da perda, enquanto essa dor é sentida. Tatiana, Valeska e Neide são mães que foram poupadas em razão dos gestos de outras que elas nunca chegaram a conhecer. Um coração e dois rins doados permitem que Maria Alice, 12 anos, Maria Eduarda, 15 anos, e Beatriz, 14 anos, tenham hoje uma vida normal.

Maria Corajosa

A fisioterapeuta e professora de ballet Tatiana Aparecida Figueiredo Camargos, 43 anos, é mãe da Maria Alice, 12 anos, também conhecida como “Maria Corajosa”. Com apenas 6 anos, a menina foi submetida a um transplante de coração, por ter nascido com miocardiopatia restritiva (doença que causa insuficiência cardíaca).

“Sempre fui a favor da doação de órgãos, mas não conhecia o suficiente sobre o assunto. Por isso, acredito que campanhas de conscientização são o primeiro passo para o aumento das doações”, avalia.

Tatiana ressalta que usa sua rede social como instrumento de ajuda para o processo de esclarecimento das pessoas sobre a importância da doação de órgãos e tecidos. Além do universo digital, também tem o hábito de falar sobre o assunto em seu círculo de amizades, no trabalho e na família.

Orgulho da cicatriz

Segundo ela, Maria Alice é grata pela doação recebida, tem orgulho da sua cicatriz e entende a importância dos transplantes de órgãos e tecidos, bem como o papel da doação para mudar a realidade das pessoas que aguardam por sua vez na lista de espera.

Tatiana fala da angústia vivida ao longo da trajetória percorrida por sua única filha até o momento da cirurgia. “É muito difícil, o chão se abre. Maria estava muito limitada: não podia correr, brincar ou se exercitar”, recorda a mãe, mais de seis anos após o transplante de sua “Maria Corajosa”, realizado em junho de 2017.

“Quando recebi a notícia de que havia chegado a vez do transplante dela, foi uma mistura de sentimentos: alegria, medo, angústia e gratidão. Ninguém morre para salvar ninguém. Doadores são escolhidos por Deus. Não é qualquer tipo de morte e de pessoa que pode ser doadora. Se houver essa oportunidade, ajude outros a seguirem vivendo. A morte pode ser ressignificada através da doação”, completa Tatiana.

Dezoito cirurgias

“Estou sem palavras para relatar o que estou sentindo. Um turbilhão de emoções. Enfim, hoje, Maria Eduarda está sendo abençoada com um rim novo, uma nova vida e uma nova história. Estou aqui para agradecer a Deus, a Nossa Senhora Aparecida e aos pais da doadora que, em um momento tão difícil, resolveram salvar várias vidas”.

Esse trecho, registrado em 18/11/2020, em uma postagem na rede social da dona de casa Valeska Rezende Porto, 52 anos e três filhos, revela o sentimento experimentado na data da realização do transplante de rim de sua filha Maria Eduarda, a Duda, hoje com 15 anos.

Duda foi diagnosticada com doença renal crônica aos três meses de gestação e nasceu prematuramente aos seis meses, após uma cesariana de urgência. Até a realização do transplante de rim, ela viveu, dos dois aos 11 anos, com apenas o rim esquerdo, que tinha sua função reduzida a 30%. Foram 18 cirurgias e 11 meses de hemodiálise até o dia do relato acima.

“Minha família se mobilizou para fazer o teste, meu marido ia ser o doador, mas estávamos no pico da pandemia e as cirurgias foram suspensas. O que mais me afetou foi o sofrimento visível da Duda; ela pesava 14 quilos e estava muito debilitada”, recorda Valeska. Em média, uma menina de 11 anos costuma pesar, aproximadamente, 35 quilos.

Até o nascimento prematuro de sua filha, Valeska revela que nunca tinha ouvido falar sobre doação de órgãos. A necessidade futura de um transplante para Maria Eduarda a levou a pesquisar e se aprofundar no assunto. “Hoje vejo a importância da doação de órgãos. Transplante é vida. Precisamos conscientizar a todos. Jurei à minha filha que levantaríamos a bandeira da doação de órgãos. Duda fica triste por saber que o número de doadores cresce pouco”, ressalta.

Sonho dos jogos olímpicos

Maria Eduarda começou a praticar natação aos 3 anos e, aos 11, teve que interromper devido às sessões de hemodiálise. Após o transplante, ela recebeu autorização médica para retomar sua rotina esportiva. Seu sonho é participar dos jogos olímpicos de transplantados que serão realizados no ano que vem no Brasil e nos Estados Unidos. A jovem também quer competir no mundial marcado para 2025 na Alemanha. Para tornar possível sua participação, Valeska organizou uma vaquinha virtual e já captou 52% do necessário para as viagens do ano que vem.

Atualmente, a adolescente integra a “Liga de Atletas Transplantados do Brasil”. O convite veio depois que membros da liga assistiram a um vídeo na rede social de sua mãe. Duda iniciou no esporte por orientação da pediatra que a acompanha, que sugeriu a prática de uma atividade física. Sua escolha foi a natação e, desde então, se dedica a ela.

Valorizar e salvar

A advogada e professora Neide Duarte Rolim, 50 anos, tem dois filhos. Favorável à doação de órgãos e tecidos, sua convicção se formou a partir das campanhas para a doação de sangue. “Sempre cultivei atos de amor e doei leite materno quando fui lactante”.

Quando sua filha Beatriz, 14 anos, recebeu o diagnóstico de insuficiência renal aos 8, com a indicação de transplante, ela sentiu a angústia de quem aguarda por esse tipo de cirurgia. “A situação da minha filha reforçou o fato de que precisamos uns dos outros, inclusive para salvar vidas. Quando recebemos o diagnóstico da necessidade do transplante, sofremos por ela ser tão pequena e ter que passar por isso. O sofrimento maior veio com o início da hemodiálise, que a fazia sentir muitas dores”, argumenta Neide.

Beatriz / Crédito: Arquivo pessoal

A advogada conta que a notícia da doença de sua filha mobilizou seus familiares, amigos e alunos que se ofereceram para fazer o teste de compatibilidade. “Fomos acalentados por um círculo de amor que se formou em torno de nós. Acredito que a tenra idade comove mais as pessoas”.

Emoção e gratidão

Os exames mostraram que Neide era compatível, mas devido a uma anemia, ela não era a melhor opção. Após o primeiro mês que Beatriz estava na lista de espera, a advogada foi informada de que havia um doador para a menina. No entanto, o rim era pequeno e a cirurgia não foi realizada.

Dois dias após, surgiu um novo doador. “Minha filha era a segunda na fila. Enquanto aguardávamos o desfecho, ela acabou quebrando o jejum pré-cirúrgico. Me justificou, aos prantos, que estava com medo de morrer. Para nosso alívio, o rim foi para o primeiro da fila. Vinte e um dias depois, havia uma nova possibilidade de transplante. No dia seguinte, veio a confirmação e ela era a primeira da fila. A emoção sentida por mim, familiares e amigos equivale ao primeiro choro do nascimento dela. Uma mistura de emoção e gratidão”, conta Neide.

A professora encara a doação de órgãos e tecidos como um ato de empatia e grandiosidade. Ela conta que, após o transplante da Beatriz, tem falado sobre a importância desse tipo de ação. Segundo Neide, as pessoas com quem convive têm se declarado doadoras. “Aceitar doar os órgãos de um filho, neto ou outro parente que se foi é a junção da dor de duas famílias para nascer gratidão e felicidade. Doar órgãos não salva apenas uma vida, como a da minha filha, salva várias”, finaliza.

MG Transplantes

A doação de órgãos e sua destinação para transplantes é coordenada, em Minas Gerais, pelo MG Transplantes, da Rede Fhemig, que é responsável pela captação e distribuição de órgãos em todo o estado, por meio da central estadual de transplantes (CET). Até o dia 26 deste mês, mais de 6,5 mil pessoas aguardavam a oportunidade de receber um órgão e poder contar suas vitórias como as três meninas.

Fonte: Agência Minas Gerais

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